terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Qual é a sua comunidade?

Qual é a sua comunidade?Giuliana Capello - 07/01/2014 às 10:32

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Viver em uma comunidade, hoje, é criar raízes voluntárias em um lugar – mas um lugar que existe de verdade, é claro – e ter um sentimento de afeto e gratidão pelas pessoas que compartilham este mesmo espaço. Mais que isso: faz parte dessa história a capacidade de criar momentos amorosos para partilhas de dons. É por isso que digo que uma comunidade próspera é aquela em que seus moradores e integrantes conseguem doar aos outros seus melhores dons e talentos.
Essa palavra, comunidade, para mim, é a mais importante, é o ponto-chave quando se trata de buscar uma vida mais leve para o planeta e mais saudável para as pessoas. Tudo fica mais fácil quando pensamos o cotidiano envolvendo mais gente ou, em outras palavras, quando temos o apoio de amigos, de gente querida, para dar conta de nossas demandas de rotina, tais como levar as crianças à escola, fazer compras, cuidar da horta ou levar o lixo à recicladora.
Mas em nossa sociedade, curiosamente, a noção de comunidade é mais usada como um eufemismo para denominar toda sorte de assentamentos precários na periferia das cidades – direto ao ponto: as favelas. A mídia é campeã nisso. Vive falando da comunidade do morro tal e tal, já reparou? É como se viver em comunidade fosse coisa de pobre, de gente que ainda não se “civilizou”, não entrou na onda do individualismo, do pensar apenas em si, que, cá entre nós, está altamente ligado ao mundo doconsumismo, e também a problemas como depressão, alcoolismo, obesidade etc…
Pois bem, se considerarmos que nas cidades as famílias estão cada vez menores e mais fechadas em si mesmas (por conta da falta de tempo para cultivar amizades, fazer programas por lazer ou simplesmente ter vida além do ambiente de trabalho), fica mais fácil entender que nas favelas, nos bairros mais pobres e nos pequenos vilarejos o convívio social é realmente mais intenso. Nesses lugares, sem desprezar as dificuldades alarmantes que permeiam as famílias, as crianças se misturam mais, há menos muros entre vizinhos e as mulheres criam arranjos próprios para revezar o turno de trabalho com o cuidado com as crianças. Há também mais festas abertas ao entorno, dessas em que a escassez do dia a dia vira abundância em minutos, permeada por uma alegria que parece até incompatível com a rotina dessas famílias…
O que eles têm que não vemos na maioria dos edifícios residenciais da classe média? Uma comunidade, um olhar capaz de perceber o outro como aliado, como amigo, como alguém que mereça atenção. É por isso que é mais fácil encontrar e sentir solidão no anonimato das grandes cidades, nas salas de apartamentos decoradas com home theaters e telas de tv que crescem de maneira inversamente proporcional ao número de pessoas reunidas à sua frente.
Trouxe este tema hoje porque reli, nos últimos dias, um livro de que gosto muito: O Espírito da Intimidade (Editora Odysseus), escrito por Sobonfu Somé, que é da tribo Dagara, de Burkina Faso, na África. Ela e seu marido, Malidoma Somé, ensinam pelo mundo a antiga sabedoria de sua aldeia. No livro, que mais parece uma conversa (claro, é pura tradição oral compartilhada!), Sobonfu dedica um capítulo ao que chamou de “o abraço da comunidade”. E diz: “A comunidade é o espírito, a luz-guia da tribo; é onde as pessoas se reúnem para realizar um objetivo específico, para ajudar os outros a realizarem seu propósito e para cuidar umas das outras. O objetivo da comunidade é assegurar que cada membro seja ouvido e consiga contribuir com os dons que trouxe ao mundo, da forma apropriada. Sem essa doação, a comunidade morre. E sem a comunidade, o indivíduo fica sem um espaço para contribuir. A comunidade é uma base na qual as pessoas vão compartilhar seus dons e receber as dádivas dos outros”.
Mas, e na falta de uma comunidade, o que acontece com as pessoas? Nas palavras de Sobonfu, “quando você não tem uma comunidade, não é ouvido; não tem um lugar em que possa ir e sentir que realmente pertence a ele; não tem pessoas para afirmar quem você é e ajudá-lo a expressar seus dons. Essa carência enfraquece a psique, tornando a pessoa vulnerável ao consumismo e a todas as coisas que o acompanham”.
Entendeu o espírito da comunidade? Então, que você e eu possamos ter em 2014 a oportunidade de fazer parte de uma comunidade de verdade, de viver o prazer de sentir raízes sob nossos pés que nos liguem, pela gratidão e pelo amor, ao lugar onde moramos e às pessoas que escolhemos (e nos escolheram) para ser uma espécie de família ampliada na Terra. Um viva aos amigos! E um viva à natureza generosa que nos acolhe com belezas e lições sem fim! Feliz 2014 para você!
Foto: Mr Marmot via photopin cc

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